terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Por que tristeza

Foi repentino como acordar de um belo sonho. Ele deu a bicada num susto e já mostrou que ali quem manda é ele, o poderosão. Dava pancadas com uma força tremenda que ecoava, e chegava a assustar ele mesmo.

Parei pra pensar dia desses em um ditado que nunca fez sentido para mim. “A grama do vizinho é sempre mais verde”. Ok, eu sei que nada tem a ver com jardinagem, ou cores, ou até mesmo vizinhança. Tem a ver com liberdade. Mas o que me deixa intrigado é que, em uma realidade nua e livre de mentiras, ela não passa de uma reclamaçãozinha sem sentido.

Ser livre, segundo o sentido geral, é ter a capacidade de poder fazer, agir, pensar, falar como diabos se bem entende. Logo, ela é utópica, afinal as responsabilidades, o respeito, os bons costumes nos impedem de viver como queremos. É preciso ser correto, e o certo é ter um emprego, família e os escambau. Tudo empurrado goela abaixo. Até aí, nenhuma novidade.

Quando se parava pra observar, não era o vidro seu objeto de desejo. Afinal, era vinte vezes maior que ele e de nada servia. Não. Seu desejo era o que aquele vidro espelhava. Era ele mesmo.

Mas e se eu te dissesse que o mundo todo está errado? Que essa liberdade genericamente vomitada por pessoas infelizes é tão verdadeira quanto as multi-funções da Tekpix? Pois é. Gritar aos sete ventos que ser livre é ser feliz significa, nada mais nada menos, que admitir que se errou.

Viver como um nômade, caminhando e conhecendo o mundo todo, todo mundo, é uma escolha que muitos podem dizer ser corajosa, heroica e bla bla bla. Eu acho que tem colhões quem resolve botar um filho no mundo e dizer que vai dar a ele o suporte de uma vida. A liberdade nada mais é do que um estado de espirito.

Enquanto olhava seu reflexo ali, preso em meio à grade, ele bicava de novo o vidro, me fazendo tomar mais um susto. Abri a janela, e como um maluco disse “vai, entra, seu maldito!”. Ele voou longe, desapareceu.

Achar que sua vidinha medíocre, de trabalho, casa e o barzinho ocasional no fim de semana é uma prisão é o grande erro. Sua prisão é admitir que não há o que se fazer para mudar, que a rotina já se consumiu, que o leite já derramou e o que resta é chorar e chorar. Aí passa o garotão, no carrão, com o mulherão, bebendo um whiskyzão. “Maldita mulher, não para de me ligar. Melhor eu voltar pra casa.”

Pouco sabe você que, na verdade, aquele cara quer gritar tanto quanto você. “Dormir com uma mulher, acordar abraçado, com um cafuné é bom. Ruim é saber que mesmo assim, você está sozinho”, disse um caro amigo meu. Quem vive na ‘piranhagem’ a vida toda reza, dia e noite, para ter responsabilidades, um filho, um emprego chato. Parece idiota? E é mesmo, a patética tristeza se junta e se completa. Eu quero o que você tem, enquanto você deseja loucamente o que eu tenho.

Pensei ser medo, foi por isso que fugiu. Mas no outro dia lá estava, bicando, dessa vez às seis da manhã! O maldito só queria me atazanar, ou quem sabe era retardado mesmo... Um som veio de fundo, e pude jurar que vi tédio naquele bem-te-vi.

Mas se for assim, então, todos somos tristes miseráveis e o ditado faz completo sentido. Desejamos o que o outro tem, já que o nosso não satisfaz. Não mais. A infelicidade não é uma âncora, que te afundou ao infinito. É, ao mínimo de tudo, um degrau que parece por demais alto. Escalar esse degrau significa evoluir, crescer, ganhar mais experiência, vivência, escolha o termo que quiser.

Ser feliz é entediante. Ter uma boa vida é chato, ao todo e completo. Não ter sobre o que reclamar é admitir que, deste ponto para frente, nada vai mudar. Por isso temos esse desejo incontrolável de acreditar que “a grama do vizinho é mais verde”. A nossa grama é tão verde quanto, só olhamos tanto para ela que nos acostumamos com a paisagem, e agora só enxergamos cinza.

Já sem paciência de fazer sempre o mesmo, quis sair de casa. Olhei pra fora e vi o desgraçado do pássaro na minha janela. De novo. “Pra que vir pra cá, se podes voar por tudo?”, pensei, achando que era o poeta romântico. Ele respondeu com uma bicada. Desta vez, juro, vi raiva nele.

Ser livre para fazer o que quiser é um sonho tão besta, que chega a fazer sentido. Mas quando a gente para e pensa, essa vidinha mais ou menos, essa rotina incansável, não passa de uma escolha nossa, de uma escada que ao invés de subir, incessantemente queremos descer. Nós que preferimos ir para a faculdade, e não para Istanbul. Escolhemos o emprego de escritório, e não o salto de para-quedas. A maior virtude de um adulto é se responsabilizar por suas atitudes, e mais que isso arcar com as consequências.

Ser um baita de um infeliz por que o sonho de ser astronauta ficou no passado é uma reação natural, diria até mesmo boa. Essa angustia de buscar a liberdade é simplesmente o mundo gritando, desesperado, para que não paremos. Se a vida parece revirada, vire de cabeça pra baixo. A liberdade anda de mãos dadas com o desejo de fazer diferente. Ser livre é ter a capacidade de saber que se pode fazer tudo, e não a permissão para.

“Mas o que tanto esse pássaro quer aqui?”, esperneei, indignado. Se quer entrar e se prender, que o faça. Se quer a liberdade, voe mundo afora. Errado eu, não percebi que o que ele queria era saber como seria se tivesse tomado outras decisões. Ele queria saber como aquele outro bem-te-vi, preso lá dentro, vivia.

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2 comentários:

  1. Sábias palavras, Vini. Estamos atrás de sarna pra coçar, da tal felicidade. O importante é não parar — nesse caso, jogar a toalha pode nos fazer muito mais infelizes. Sigamos em frente e pé na tábua.

    Abraço e continue atualizando!

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  2. O que mais gosto é a maneira como você expressa tudo.

    Eu creio que as pessoas se enganam num detalhe pequeno. Ser feliz é um SER e não TER. Só que ninguém sabe o que quer. Se me dessem 10 mil anos pra projetar uma garota que fosse perfeita pra mim, não chegaria nem perto da garota que eu amo. Porque mais uma vez, não sei o que quero até encontrar/experimentar/viver.

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